28.2.10

ele _ olhe eu vou embora porque você é impossível!
ela _ é que só sei ser impossível não sei mais nada. que é que eu faço para conseguir ser possível?











ele _ pois é.
ela _ pois é o quê?
eu só disse pois é!
mas "pois é" o quê?
melhor mudar de conversa porque tu não me entendes.
entender o quê?
vamos mudar de assunto e já!
falar então de quê?
por exemplo de você.
eu?!
porquê esse espanto? tu não és gente? gente fala de gente.
desculpe mas não acho que sou muito gente.
mas todo o mundo é gente!
é que não me habituei.
não se habituou com quê?
não sei explicar.
e então?
então o quê?
olhe eu vou_me embora porque tu és impossível.
é que só sei ser impossível não sei mais nada. que é que eu faço para conseguir ser possível?
pára de falar porque tu só dizes asneiras! diz o que é do teu agrado.
acho que não sei dizer.
não sabe o quê?
hein?
olha até estou suspirando de agonia. vamos não falar em nada está bem?
sim está bem como tu quiseres.
é você não tem solução.
é?
pois se eu estou dizendo! você não acredita?
acredito sim acredito acredito .





a hora da estrela de clarice lispector pág. 56 e 57











ela_ é que só sei ser impossível não sei mais nada. que é que eu faço para conseguir ser possível?



é possível que por cada palavra dita me veja livre de um pouco de ti. tu não vês que não estou aí? daqui a pouco não sei o que dizer. e é possível que volto a ser_me impossível.







fotografia de beata bieniak

18.2.10

estupor









estorva_me perturba_me estropia_me estupor de um raio!



















ela me acena com as sobrancelhas e volta a abaixar a cabeça, os cabelos cobrindo_lhe o rosto, entretida com umas fotos que folheia e organiza em pequenas pilhas. prepararam meu lugar de frente para ela, um pouco distante, e nas fotos que ela me passa sem me olhar não há pessoas, somente parques, ruas, alguma neve, paisagens repetidas que despacho em meio minuto. devem ser fotos do início da viagem, quando ela estava sozinha e emocionalmente abalada; embora tenha curso de fotografia, seus enquadramentos estão irregulares, a luz insuficiente ou estourada, como se ela quisesse liquidar depressa o filme. nas fotos que empilha fora do meu alcance, imagino que já apareça com a pele fresca, talvez abrindo os braços numa ponte, tendo ensinado um desconhecido a manejar a máquina. e nas fotos mais recentes, que coloca de pé atrás do bule de leite, acho que entram os amigos que ela sempre vai fazendo, e os amigos dos amigos, e os artistas, e as autoridades, e as luzes do barco no jantar de despedida.







o estorvo de chico buarque pág. 15









































estorvo estorvar exturbare distúrbio perturbação torvação turva torvelinho turbulência turbilhão trovão trouble trápola atropelo tropel torpor estupor estropiar estrupício estrovenga estorvo































não me sais da cabeça és um estorvo que tenho de aturar não me sais da cabeça passar o tempo a estorvar_me não me sais da cabeça e nem tentas perturbar_me que raiva não me sais da cabeça turva tapada infectada raios te partam não me sais da cabeça trápola não me sais da cabeça atropelas_me a vontade não me sais da cabeça estupor maldito de apagar não me sais da cabeça estrupício estrovenga pára!sabor amargo em saber que nada há. estorva_me perturba_me estropia_me estupor de um raio.











fotografias de kuba mazi e wojtek niedzielko

2.2.10

pim pam pum






I get no kick from champagne
Mere alcohol doesn't thrill me at all
So tell me why should it be true
That I get a kick out of you

Some get their kicks from cocaine
I'm sure that if I took even one sniff
That would bore me terrifically too
That I get a kick out of you
I get a kick every time

I see you standing there before me
I get a kick though it's clear to me that you obviously do not adore me




jamie cullum i get a kick out of you

nota sem ser em rodapé: só porque ando a ver e a ouvir muito o cullum e me apetece muito ou talvez ainda não sei








as imagens que se seguem poderão muito bem ferir ou talvez não a susceptibilidade de muitos observadores podendo no entanto chamar alguma atenção para outros leitores mais desatentos. o que se segue é improvável mas não impossível.
















"pim pam pum cada bala mata um lá em cima no huambo está um copo com veneno quem bebeu morreu" em cima em baixo sobe_se desce_se fuma_se ou nem por isso destina_se o fim da frase desejando_se nos entretantos que uma presença se apresente ou não impotente arrebatadora disfarçadamente como sopro por cada vez que se decide avançar parando_se sem pensar para quê? adianta não forçar? acontece que atabalhoadamente todos os disparates sem sentido o fazem sempre que estás assim comigo de ti que tardas e o que se passa quem o sabe? deixo_me andar até me cansar mas uma coisa é certa não tenho porto nem seguro nem remédio onde me agarrar e o ir directo ao assunto é de evitar claro subtilmente assim quem o consegue explicar? o silêncio é o que me cala e é nele que não me convém precipitar apesar da vontade ser contrária e rebentar_te nas mãos alguma coisa do que me vai na página escorrega_me nos dedos a tua falta e continuará a escorregar corre_me nos braços o querer_te abraçar essa vontade de enlear_te essa vontade de te gostar cortar_te a boca amassar_te a língua engolir_te os lábios "pim pam pum cada bala mata um lá em cima no huambo está um copo com veneno quem bebeu morreu".







de insónias hoje










fotografias de helen breznik