post scriptum

há doenças piores que as doenças
há dores que não doem nem na alma
mas que são dolorosas mais que as outras
há angústias sonhadas mais reais
que as que a vida nos traz há emoções
sentidas só como o imaginá_las
que são mais nossas do que a nossa vida.
há tanta cousa que sem existir
existe existe demoradamente
e demoradamente é nossa é nós
por sobre a alma a adejar inútil
do que não foi nem pôde ser e é tudo.
dá_me mais vinho porque a vida é nada.
19.11.1935
in poesia do eu de fernando pessoa pág.349

há nas horas um tempo mágico que não se vê nunca nos ponteiros de nenhum relógio. aquele em que o tempo é de não e de nada. outros há em que se demora em atravessar. demoradamente não tarda. vagarosamente passa. não. não adianta olhar para dias de ar. são dias de brancas vivas. brandas vidas. fracos abraços. desventura de tempo este o nosso.
dá_me antes um rio de marés com sal de amar. bravo. dá_me antes um dia que não faça já parte de nenhum calendário. dá_me o não de um nada. dá_me. porque há horas em que o não nada mais é a não ser de nada. mas dá_me.
alento_me ao alto algures rumo sem norte sem conseguir tocar.

post scriptum: de querer tanto escrever inscrevo_te na página. creio assim ser que na dúvida de o tentar ser ou escrevê_lo ficas como que como posso falar mais ainda dentro em mim apesar de saber que não acontecerá. mas que fazer se acredito sim que tanto o queira. não me digas que talvez não será.
algures sem rumo nem norte
fotografias de frizt faber