este maldito terror de te amar

leio o amor no livro
da tua pele demoro_me em cada
sílaba no sulco macio
das vogais num breve obstáculo
de consoantes em que os meus dedos
penetram até chegarem
ao fundo dos sentidos
desfolho as páginas que o teu desejo me abre
ouvindo o murmúrio de um roçar
de palavras
que se juntam
como corpos no abraço
de cada frase
e chego ao fim
para voltar ao princípio
decorando o que já sei
e é sempre novo
quando o leio na tua pele.
nuno júdice
braille in geometria variável pág. 79
terror, grande medo pavor pânico dificuldade o que mete medo


agora me lembro que tinha marcado uma conversa contigo. adiada temporariamente porque não se poderia conversar. agora me lembro que tinha algumas coisas para te dizer. mas como se não se dizem essas coisas? proponho_te então o nada se dizer. deixar apenas correr o que me vai no corpo apesar de tudo o que me dói agora. dói_me a cabeça dóiem_me os olhos de não te ver dóiem_me as mãos de não te ter dói_me a boca de não te saber e dói_me o juízo sem perceber muito bem porquê.
quero lá saber de quem agora tens aí de lado. a verdade és tu a vontade és tu o desejo és tu. isso sim quero saber.
entras_me assim sem mais nem menos ao final deste tempo todo como quem não quer nada limpas os pés no tapete da entrada como que querendo apagar memórias que nos custam acreditar ser verdades entras_me assim pela casa dentro disfarçando medos e vontades e eu com terror de te amar fecho_te cá dentro encosto a porta por detrás e deixo_te deitar na minha vontade de te querer muito de uma só vez por entre murmúrios mal apagados que se prolongam pela madrugada. não se dorme. é tempo desperdiçado. aqueces_me a pele com todas as letras que ficaram por dizer sete anos antes de te abrir a entrada e te deixar sentar no meu abraço de mãos abertas e boca calada ficas_me assim como quem não quer nada mas deseja no fundo o direito de me amassar a roupa limpar a língua e se espreguiçar na minha almofada onde não há ainda pele nem suada nem maltratada nem marcada. é então que te tapo a boca em beijos por não te querer ouvir dizer nada. deixa_me só ter assim o teu céu pela madrugada. abraço_te sim com tanto terror de te amar. entras_me sem nada se precisar explicar e sais_me de repente pelas portas do fundo da casa como quem não quer mais nada.
este maldito terror de te amar.
fotografias de macrolepiota